Há sempre alguém que resiste, há sempre quem diga não
Nas eleições autárquicas de 2017, aqui no concelho da Moita, os resultados eleitorais determinaram que o PCP/PEV elegesse o presidente e três vereadores; o PS elegesse três vereadores; o BE um vereador e a coligação PPD/PSD.CDS-PP.MPT elegesse também um vereador.
O presidente da Câmara, eleito pelo PCP-PEV, atribuiu os pelouros a todos os eleitos pela sua coligação, um a tempo inteiro ao eleito pela coligação PPD/PSD.CDS-PP.MPT, e meios tempos ao primeiro eleito pelo PS e ao eleito pelo BE. De todos os vereadores, eleitos livremente em eleições democráticas, exercendo o que prevê a lei, o presidente da Câmara optou por deixar sem pelouros dois vereadores do segundo partido mais votado, o Partido Socialista. A lei dá-lhe essa prerrogativa e, por isso, todos os vereadores eleitos votaram favoravelmente esta proposta embora tivessem questionado as opções.
Decorridos estes quase dois anos e meio de mandato, aos vereadores sem pelouro foi atribuída a responsabilidade de uma quase figuração. Bastantes vezes optei por, com ironia, relembrar que não era vereadora de “segunda”…
Para os vereadores sem pelouro tem sido uma continuada luta: desde o início do mandato a possibilidade de apresentar propostas, foi como diz a voz comum “tirada a ferros”, até que teve o epílogo numa reunião pública de Câmara, em 23 de outubro passado. Reunião pública que se mantêm na internet para consulta (https://cutt.ly/aypr5QI ) e são sete minutos elucidativos do que é permitido/tolerado aos vereadores sem pelouro.
A impossibilidade de exercer o serviço público resultante de umas eleições livres sempre me incomodou. Acredito, também, que quando estou a exercer as funções de vereadora represento votos entrados em urna. Acredito, de igual forma, que as funções exercidas vão para além daquilo que sou enquanto ser individual, integram momentos de Cidadania e de Serviço Público.
Pela consciência do serviço público ou do exercício da cidadania na representação de outros, fui protestando e usando a ironia para recordar o desagrado perante os subtis e sub-reptícios atropelos à Democracia.
Porém, a ironia não chega para o que se passou, aqui na Moita, no dia 25 de Abril!…
Precisamente no dia em que se celebra a Democracia, o presidente só convidou só, repito, só os vereadores com pelouro para se reunirem na Câmara Municipal para acompanharem, às 15h, todas vozes que se ergueram às janelas a cantar a Grândola Vila Morena.
Fui durante doze anos dirigente sindical num sindicato da CGTP. Também aqui tinha a consciência de que representava outros. Nunca vi ou vivi um atropelo tão grande à Democracia, nem no secretariado da Fenprof, nem nos Conselhos Nacionais quer da Fenprof, quer da CGTP.
Durante estes dois anos e meio de mandato sempre mantive a solidariedade institucional, nunca confundi o Ser Humano com o cargo de serviço público que ocupa, mas não tolero, não permito, não posso permitir em nome da Liberdade e da Democracia que alguém, no exercício do mandato dado pelo povo, desrespeite vereadores sem pelouro. Não pela não elegância da consideração pelo Ser Humano, mas antes pelo desrespeito pelos votos entrados em urna, em Eleições Livres e ainda mais, no dia da celebração da Democracia e da Liberdade.
Não aceito a gasta desculpa de que “nos concelhos ao lado”, também critico o desrespeito que por lá existe por vezes, mas foi aqui neste concelho onde moro, onde a minha filha nasceu, onde trabalho e onde percorro as ruas, que senti este atropelo à Democracia nesse dia que celebramos a Liberdade.
Por isso cito o poeta “Mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não”.
No dia da Democracia e da Liberdade, eu grito Não à discriminação.
Filomena Ventura